1 de abr. de 2012

A bruxa tá solta

Infelizmente, me faltam clichês e lugares comuns neste momento para comentar a morte do meu amigo pessoal (e impessoal também) Millôr Fernandes, o genial Millôr. Pena que o Millôr não possa comentar o seu próprio velório para demolir, uma a um, as bobagens que as pessoas estão falando sobre ele. É por causa do falecimento de pessoas como Millôr e Chico Anysio que eu sempre combati a morte com unhas e dentes e, até hoje, me recuso veementemente a bater as botas. Para desespero dos meus 17 leitores e meio (não esqueçam do anão que é o meu maior fã, quer dizer, menor fã).

Orfão de pai e mãe ainda na infância, Millôr, devido às más companhias, acabou caindo no jornalismo de imprensa. Conheci o Millôr no tempo da revista O Cruzeiro, a Veja daquela época, que era dirigida por Assis Chateaubriand que, mais tarde, desistiu do jornalismo para virar filé. Eu trabalhava de dia em A Noite, de tarde em O Dia e de noite em A Manhã. Brilhante, Millôr foi o maior frasista do Brasil, quer dizer, do mundo. Muito melhor que Oscar Wilde que pode ser considerado o Millôr Fernandes da língua inglesa. Millôr também traduziu Shakespeare para o português e ficou muito melhor que o original. Jogador inveterado, apostou tudo no Pif Paf, semanário de humor que os exames de DNA comprovaram ser o pai do Pasquim.

Escritor, jornalista, dramaturgo, desenhista e artista gráfico, Millôr também exercia a arte da conversa fiada com maestria. Ver o Millôr, ao vivo, falar com graça e inteligência sobre praticamente qualquer assunto era uma espetáculo admirável e, confesso, humilhante para nós, pobres mortais, que só usamos 10% da capacidade do nosso cérebro e assim mesmo só para pedir uma propina.

E como se não bastasse o Melhor Fernandes, lá se foi para a terra dos humoristas de pés–juntos o grande Chico Anysio. A Santa Casa de Misericórdia não tinha caixões em estoque suficientes para sepultar os 209 personagens do grande humorista, um dos poucos cearenses que não virou sushi-man. Além de seus personagens inesquecíveis, Chico Anysio contribui muito para o aumento populacional do Brasil fazendo um montão de filhos. Para pagar tantas pensões alimentícias, Chico teve que ralar até o fim da vida o que, aliás, foi ótimo pra nós, seus fãs, que também não conseguíamos sobreviver sem as suas piadas. Generoso, Chico também era preocupado com a educação e criou a Escolinha do Professor Raimundo que matriculou muitos humoristas, alguns até que não sabiam nem ler nem escrever. Polivalente, versátil e cheio de contas pra pagar, Chico fazia de tudo: escrevia, atuava, dirigia, fazia músicas e pintava. Pintava e bordava. A quantidade de mulheres maravilhosas que o esquálido pau de arara traçou supera até mesmo o número de personagens que criou.

E eu vou ficar bem quieto aqui no meu canto, na última página do Segundo Caderno, na minha, porque a bruxa está dando um rasante pro lado dos humoristas. Por que é que esta sinistra feiticeira não vai voar com a sua vassoura pro lado dos políticos, onde tem tanta gente boa pra morrer e, assim, dar uma alegria pro povo brasileiro?

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